E se... não existisse polícia? (Texto de Otávio Cohen publicado na Revista Superinteressante, edição 302, março de 2012)
O que se viu com a greve da PM da Bahia reflete só parte do caos possível numa sociedade sem força pública de segurança. Em 12 dias de paralisação, o total de homicídios bateu em 180, mais do que o dobro do período anterior. O Exército foi convocado para garantir a ordem, mas isso não impediu o aumento da criminalidade.
O que se viu com a greve da PM da Bahia reflete só parte do caos possível numa sociedade sem força pública de segurança. Em 12 dias de paralisação, o total de homicídios bateu em 180, mais do que o dobro do período anterior. O Exército foi convocado para garantir a ordem, mas isso não impediu o aumento da criminalidade.
Em 1997, em Pernambuco, PM's e policiais civis cruzaram os braços também por 12 dias. O cenário foi ainda pior: arrastões de gangues no Recife, saques, escolas e lojas fechadas. Nem o Instituto Médico Legal funcionou. Na prática, sem pessoal e estrutura específica para fazer valer o que diz a Constituição, o Estado perde muita força. Poderia contratar serviços específicos para conter um protesto ou impor uma nova lei, mas fica sem capacidade adequada de mobilização, integração, fiscalização. E, mais grave, diz a pesquisadora Jacqueline Muniz, o Estado perde a confiança do cidadão - a essência, que faz com que cada um pode se achar no direito de fazer justiça com as próprias mãos. Prevaleceria nas ruas a lei do mais forte. Ou melhor, do mais rico. A segurança ficaria a cargo de empresas especializadas. Você andaria armado e poderia até escolher um pacote que coubesse no seu bolso para se sentir seguro. Empregadores ofereceriam planos de segurança, como fazem com os planos de saúde hoje. Quem não pudesse pagar as empresas registradas contrataria mercenários ou se uniria em milícias. "Grupos usariam mais violência para garantir a ordem e a segurança", afirma Graham Denyer Willis, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts.
Segundo ele, nada muito diferente do que ocorre nas comunidades onde a polícia não entra e quem de fato manda são os chefes do tráfico. Uma pesquisa da London School of Economics mostrou que a maioria dos ativistas que participaram dos confrontos e quebra-quebra nas ruas de cidades inglesas em agosto do ano passado estava ali para se vingar dos abusos cometidos pela polícia no passado. A violência policial é argumento comum contra a própria existência da polícia, mas, no fim das contas, imagine se você não pudesse nem chamá-la.
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