domingo, 21 de agosto de 2011

"A Polícia está doente, precisamos recuperá-la"

Por Andrey Ricardo
JORNAL DE FATO

A declaração é do delegado Marcus Vinícius, responsável pela Delegacia de Homicídios (DEHOM) de Natal e um dos envolvidos no projeto de criação de uma Divisão de Homicídios, que vai contemplar Mossoró com uma unidade especializada nesse tipo de crime. Marcus está ministrando um curso em Mossoró sobre investigação criminal para policiais civis e militares. Nesta entrevista, ele fala sobre a situação da investigação no RN, suas dificuldades devido à falta de recursos humanos e materiais, os problemas para investigar crimes cometidos por policiais, a importância de saber estudar a cena de um crime e outros aspectos da atividade policial. A única ressalva do delegado foi quanto à sua imagem, que será preservada pelo DE FATO devido seu tipo de atuação.
marcos garciaMarcus Vinícius, delegadoMarcus Vinícius, delegado

Como o senhor avalia hoje o trabalho de investigação de homicídios que é feito no Rio Grande do Norte?

Os homicídios de Natal correspondem a quase 70% dos assassinatos ocorridos no Rio Grande do Norte. A Delegacia de Homicídios tem por atribuição apurar os homicídios dolosos de autoria desconhecida que ocorrem no município de Natal e quando houver determinação da Secretaria de Segurança (Pública e Defesa Social), a exemplo do que ocorreu em Mossoró (morte de Augusto Escóssia, servidor do INSS, em 2007), Campo Grande (morte do agente penitenciário federal Iverildo Antônio, em julho passado) e outras cidades. A maior dificuldade nossa hoje é pessoal, já falado pela administração superior de que com o efetivo que dispomos não conseguimos fazer frente a todos os casos de assassinatos que aparecem aí. Nós estamos correndo atrás para tentar fazer frente a essa demanda que infelizmente tem aumentado em todo o Rio Grande do Norte.

Se em Natal, que existe uma delegacia específica para investigar assassinatos, a situação é complicada, como o senhor avalia a investigação de homicídios no interior, que é feita por delegacias que apuram vários crimes ao mesmo tempo?

Em 2007, nós que fazíamos a (Delegacia de) Homicídios, elaboramos um plano que audaciosamente foi intitulado Plano de Redução de Homicídios em Natal. Trata-se de um documento de 100 páginas que continha um diagnóstico e continha uma parte propositiva, mostrando o que fazer. A situação é essa. O documento mostrava a realidade e as sugestões para a administração superior fazer. Esse material foi apresentado em 2008 e foi aprovado, mas fomos orientados a aguardar o concurso público (509 policiais treinados esperam ser chamados) para suprir a Polícia Civil em seus quadros para poder colocar em prática o nosso projeto. Nessa fase propositiva está uma estrutura nova para apurar homicídios, levando-se em conta o local com maior incidência de homicídios, que seria Natal e região da Grande Natal. O plano ainda não foi executado e nós recebemos a determinação de apresentar a estrutura para a instalação de uma Divisão de Homicídios. Quer dizer, veio muito maior do que nós imaginávamos. Pegamos o material, retrabalhamos e apresentamos. Mostramos o que seria preciso para isso acontecer e casou com um convênio com o Ministério da Justiça, de quase R$ 1 milhão, que está sendo finalizado agora. Nesse convênio foram adquiridos alguns elementos para dotar o Rio Grande do Norte de uma melhor estrutura para investigar os crimes de homicídios, que vai atender os dois grandes centros urbanos do Estado, que são Natal e Mossoró. A Divisão de Homicídios vai sair com a nomeação desses policiais. Serão quase 100 policiais que vão atender Natal e Mossoró. Está previsto, inclusive, o plantão de local de crime, com uma equipe de aproximadamente 20 policiais investigando somente os casos de homicídio na cidade. Ou seja, teríamos plantão. Hoje a dificuldade da investigação é aquela inicial, a preliminar que não ocorre ou não acontece a contento. Temos informações que a equipe da Segunda DP (uma das duas delegacias que investigam assassinatos cometidos em Mossoró) tem tido um bom resultado na apuração das infrações. Eles chegam a números significativos justamente porque vão ao local do crime. Essa delegacia virá para atender isso. Nós não estamos bem. Não está nada bom, mas há preocupação de melhora. Vai depender agora da nomeação desse pessoal. De nossa parte, esperamos que aconteça para reduzir esses números de Mossoró, grandes. Servirá também para desafogar as distritais. Hoje, o delegado tem que parar as outras atividades para dar atenção aos assassinatos.

É possível enxergarmos uma aproximação do trabalho que é feito pela perícia da Polícia Federal, que tem uma estrutura bastante avançada nesse aspecto, com o que é feito atualmente pela Polícia estadual?

A gente tem que pensar sempre. Se não pensar que vai melhorar, a gente tem que entregar isso aqui e deixar. Não quero mais ser polícia. Eu defendo que o incomodado tem que se mudar... Eu vou sair por aí falando mal da Polícia? Eu tenho que tentar melhorar. Tenho um colega que fala uma coisa interessante: "Tem um doente e ele está mal. Mas não é porque ele está mal que eu vou desligar os aparelhos para ele morrer. Vou tentar recuperá-lo". Se fizermos esse comparativo hoje com a Polícia, que está doente, eu vou apagar os aparelhos, desligar? Não. Eu tenho que tentar fortalecê-la, ministrar um medicamento para que ela venha a se recuperar. A gente está correndo atrás. Fizemos esse trabalho em 2007 (estudo para melhorar a Delegacia de Homicídios) e hoje estamos em Mossoró com um curso de investigação criminal. Temos 36 profissionais conversando, discutindo investigação criminal. É importante e devia ter acontecido há mais tempo, mas aconteceu agora. Tivemos outros cursos como de busca e apreensão, curso de psicologia forense e ainda teremos mais três cursos aqui: análise criminal, perícia criminal e local de crime. Neste segundo semestre serão seis cursos prestados aqui. A gente está pensando em melhorar, capacitar nosso pessoal. O homem tem que estar pronto, preparado. Com algum recurso material, ele vai embora...

Nenhum comentário:

Postar um comentário